Para quem tem compulsão por compras, ir aos “centros” de compras em época de liquidação e datas comemorativas é um grande perigo
Em certas épocas do ano, somos inclinados a gastar mais do que normalmente gastamos. A mídia, o comércio e a nossa remuneração nos levam a esse gasto. Com isso, é aquele “entra e sai” de loja de sapato, roupa, perfumaria, acessórios e até supermercados, sempre com uma sacolinha. Alguns até com o discurso de que estão comprando, “porque merecem”, porque trabalham o ano inteiro; outras que se escondem e falam que não estavam podendo comprar, mas precisavam de uma roupa nova. A discussão que levanto hoje é: será que a compulsão por compras é uma doença? Falta de vergonha na cara? Falta de planejamento orçamentário? Vamos discutir essa temática.
Quero que você se questione neste momento:
1. Você possui uma preocupação excessiva e/ou perda de controle sobre o ato de comprar?
2. Tem notado um aumento progressivo do volume de compras?
3. Percebe que existem tentativas frustradas de reduzir ou controlar as compras?
4. Tem comprado para lidar com a angústia ou outra emoção negativa?
5. Envolveu-se em mentiras para encobrir o descontrole com compras?
6. Percebeu prejuízos nos âmbitos social, profissional e familiar?
7. Apresenta problemas financeiros causados por compras?
Seja honesto ao responder esses questionamentos. Você se enquadra em quantos deles? Não preciso ter 100% de aprovação nessas perguntas; 50% positivo já diz que existe um comportamento por compras disfuncional. Você pode estar sendo acometido por uma doença psíquica e não sabe disso.
Entenda o transtorno de comprar
O transtorno de comprar está inserido no DSM-5 (manual diagnóstico e estatístico), no grupo dos transtornos de controle dos impulsos. A compulsão por compras traz uma associação em cadeia, até que, seja estabelecida como patologia. Inicialmente, a pessoa precisa ter o “start”, e quem tem essa função é o ato impulsivo, o desejo impetuoso de comprar, de obedecer seus pensamentos obsessivos que geram angústia e desconforto, chegando o momento em que, a voz de comando seja obedecida, nesse caso: o ato da compra. Pois, a pessoa só pensa em comprar o tempo todo.
O pensamento intrusivo surge sem que haja o desejo e aprovação da pessoa e invade a nossa mente. Não conseguindo desviá-lo, a pessoa acaba se entregando ao ato compulsivo para obter o alívio, o que gera um sentimento de culpa, sofrimento e arrependimento, por saber que cedeu a seu pensamento e que não poderia ter comprado, mas que não é suficiente para inibir a próxima compulsão.
Ao responder esse pensamento (obsessivo) intrusivo, são liberados, imediatamente, neurotransmissores (cérebro), que produzem a sensação de prazer e alívio. Fechando esse ciclo, ele se repete constantemente pela necessidade de responder essa voz, que são os pensamentos intrusivos, configurando-se em um ato compulsivo. Podemos notar então que se trata de uma patologia, que não é tão simples e exige uma intervenção em três áreas disfuncionais diferentes: impulsividade, obsessão e compulsão.
O ato de comprar se dá pelo desejo
Podemos compreender que a compulsão é um comportamento repetitivo e incontrolável, mal adaptativo, que podemos adquirir de qualquer coisa, seja por comida, drogas, álcool, sexo, cigarro, trabalho, atividade física ou compras. Nesse caso, o ato de comprar se dá pelo desejo e não pela necessidade.
Para quem tem compulsão por compras, ir aos centros de compras em época de liquidação e datas comemorativas é um grande perigo. É preciso fugir do perigo, porque o fato de saber que está em promoção, independente do quanto de desconto aquela loja oferece, já é um grande atrativo para o compulsivo. Quantos não exageraram na “Black Friday”? Consumiram muito mais pela força da propaganda do que pela necessidade do produto. E os exageros das festas de fim de ano? Roupas e brinquedos caros que enchem os olhos e realizam sonhos no Natal!
A disposição das mercadorias nas vitrines, as cores, os produtos (…), todas as coisas são apresentadas de forma a atrair o olhar do consumidor. No entanto, existe uma parcela da população que é atraída com maior facilidade, por terem esse transtorno consciente ou inconscientemente. É preciso ter consciência daquilo que você é, das suas limitações, para que possa lutar contra elas de forma adequada e com um poder de força maior por conhecer meu “inimigo”.
Qual é a causa dessa compulsão?
Infelizmente, não é como uma receita de bolo, que tem seus ingredientes e preparo bem descritos. Na psicologia, é preciso sempre averiguar a história da pessoa, pois pode ser que a raiz do problema seja fruto de um processo traumático vivido em uma determinada etapa da vida, que hoje, na vida adulta, apresenta-se desta forma. Essa resposta é um mecanismo de defesa adquirido por consequência de um quadro de vulnerabilidade emocional, ansiedade, sentimento de perda ou até mesmo um comportamento aprendido, que é acionado quando se sente ameaçado. Esse comportamento, normalmente, vem associado também a um transtorno de humor; no caso, depressão, ansiedade e fobia podem estar associados ou não. Inicialmente, o que se deve fazer é fugir da ocasião que o leva à compulsão, é entrar nas lojas apenas se verdadeiramente houver necessidade de compra e aprender a responder seus pensamentos intrusivos, para domá-los.
As respostas precisam ser coerentes e reais, para ser capaz de modificar o pensamento – o que não é fácil –, pois ele é imaginário e potente. Pode ser que sozinho você não consiga resistir e responder a seus pensamentos, por isso, o ideal é procurar ajuda psicológica para que um profissional o auxilie a vencer essa limitação.
O ato de comprar pode sim gerar prazer. A questão está em alimentá-lo com grande frequência, tendo por vezes comportamento impulsivo, caindo em um ciclo vicioso, e que a pessoa perde o controle. Diante desse cenário e vivendo tempos de crise, lanço uma pergunta: Estou podendo consumir o tanto quanto tenho costume? Ou será que não estou conseguindo controlar meus impulsos e acabo comprando um pouco mais do que deveria e poderia?
Fonte: portalcancaonova.com – Aline Rodrigues